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“De fato, parar não está nos meus planos”, diz Vantine ao completar 50 anos de carreira

 

Publicado em 14/12/2022

Nome precursor da logística brasileira, José Geraldo Vantine concedeu entrevista exclusiva para a MundoLogística falando da própria trajetória, dos temas relevantes do setor no momento e dos planos para o futuro

Por Christian Presa


Foto: Arquivo pessoal

Em comparação a outros segmentos, a logística tem uma história relativamente recente no Brasil. Dá para dizer que o segmento ganhou força entre as décadas de 1980 e 1990, junto aos primeiros sinais claros da Tecnologia da Informação.

O resto é história. Com o passar dos anos – marcados pela eclosão da internet, a globalização e a elaboração das cadeias de suprimento –, a logística alcançou o posto de protagonismo que promete ser ainda mais sólido no futuro.

Essa construção de um dos segmentos mais importantes do país é diretamente relacionada à trajetória de alguns grandes nomes. Um deles é José Geraldo Vantine, que está completando 50 anos de carreira em 2022.

Em entrevista exclusiva para a MundoLogística, Vantine falou sobre a própria trajetória, destacou temas relevantes para o setor e deixou claro: parar de atuar em logística não está em seus planos.


MUNDOLOGÍSTICA: É preciso ressaltar que 50 anos de carreira é muito tempo, mas vamos partir do começo: como você chegou à Logística?

JOSÉ GERALDO VANTINE: Existem certas atividades profissionais, especialmente as de cunho intelectual, que quanto maior o tempo, maior a competência. No meu caso, a coincidência de 50 anos de formado em Engenharia e o início da minha carreira em Logística, em 27 de novembro de 1972, foi um marco do primeiro passo de uma jornada que ainda não terminou. A Logística não chegou até mim. Eu busquei a oportunidade há 50 anos terminando estágio na General Motors e, entre várias vagas, escolhi a de “Engenheiro de Desenvolvimento de Fornecedores”. Fui o primeiro engenheiro da área de Supply. Um ano depois, em Detroit (EUA), meus colegas americanos me apresentaram o Institute of Logistics Engineering. Esse foi nosso encontro. Ressalta-se que a Logística nasceu no ambiente industrial e com foco na engenharia, razão pela qual participei de muitos e importantes projetos de expansão na fábrica de São José dos Campos (SP). Por conta disso, tive o reconhecimento da empresa, representando uma carreira de crescimento rápido e em cinco anos já estava na função de Superintendente de Engenharia de Movimentação e Armazenagem, que hoje é a Intralogística.

A Vantine Consulting também já tem uma história consolidada, com quase quatro décadas de atividades – e contando. Qual é o papel que uma consultoria tem hoje no setor?

Verdade. Após a minha jornada na General Motors do Brasil, e descobrindo alguns atributos e talentos na minha pessoa, entendi que elaborar projetos e ensinar eram meus próximos passos. Daí, comecei a dar aulas e em 1986 fundei a Vantine Logistics Consulting, após ter sido sócio-fundador do Instituto de Movimentação e Armazenagem de Materiais, em 1979. A missão de uma empresa de consultoria especializada é muito nobre e, no meu caso, como pioneiro e protagonista do desenvolvimento dessa ciência – porque sim, Logística é uma ciência hibrida composta por elementos de Administração de Empresa, Engenharia de Produção, Administração de Marketing, Economia e Finanças –, tenho a felicidade de ter auxiliado cerca de 500 empresas em quase 1 mil projetos. Ao longo do tempo, como qualquer ciência, a Logística evoluiu e se transformou e a consultoria hoje, no nosso caso, tem o papel predominante de criar soluções estratégicas num mundo globalizado altamente competitivo, com excesso de tecnologia e um comércio digital de crescimento exponencial ainda incontrolado.

A sua visão da Logística é muito relacionada a negócios e a questão de gerar lucro/valor. Sua perspectiva sempre foi essa ou foi algo que mudou ao longo dos anos – e qual a razão de ter sido assim?

Na verdade, eu sempre atuei na Logística sobre três focos: Gestão, Operação e Infraestrutura, aplicados em três segmentos empresariais: Indústria, Varejo e Serviços, ressaltando que a Logística para o Agronegócio é mais recente e ainda muito focada apenas no transporte. Portanto, a minha perspectiva sempre foi sistêmica e holística e ela foi, sim, mudando ao longo dos anos. Isso é necessário para a sobrevivência e a razão maior é exatamente a grande força da dinâmica que faz o mundo mudar constantemente.

O impacto da tecnologia é notável, mas você mesmo diz que “na prática, a teoria é outra”. De que forma você acredita que a logística deve incorporar a tecnologia?

Bem, essa frase não é minha, vez ou outra eu aplico, mas o que eu uso sempre como mantra é “Entre a teoria e a prática, fiquem com as duas”. No entanto, a expressão “na prática, a teoria é outra” faz todo sentido em vários setores e, no caso da Logística, ressaltei até mesmo em artigo a questão da utilização da tecnologia da informação. Demand Planning, por exemplo, é o caso mais antigo e mais conhecido em que até mesmo com o uso da inteligência artificial, a ocorrência de 100% de certeza é quase 0%. Visitando definição técnica da Logística [“parte integrante do Processo da Cadeia de Abastecimento que planeja, implementa e controla de forma eficaz e eficiente o fluxo de armazenamento de bens, serviços e informações relacionadas, desde o ponto de origem ao ponto de consumo de modo a atender aos requerimentos dos clientes”], vemos que sua responsabilidade está no equilíbrio entre fluxo de informações e materiais onde certamente lá em 1986, quando foi criada essa definição no então Council of Logistics Management, sabia-se que um dia essas informações sairiam do papel para o digital. É o que acontece hoje, embora ainda com mais erros do que acertos na digitalização dos processos da Logística, e a forma para incorporar a tecnologia para a Logística é formada por um tripé: desenho de processo, especificação de sistemas e qualificação de mão de obra.

Na sua opinião, existe algum assunto ou questão que ainda precisa ser “desbravado” pelos atores da logística brasileira?

Desbravar não creio, mas os setores que ainda necessitam de aprofundamento, de estudos técnicos e de formação profissional estão mais direcionados a atuar no agronegócio com olhar da Logística Integrada. No momento, o setor trabalha ainda no primeiro estágio, que é infraestrutura de transportes e portos. Outra questão é a formação do profissional no ambiente acadêmico com formação clássica, e não apenas o de “tecnólogo”. Observemos que nas organizações, a Logística é funcional [exerce uma função], e não profissional. Além disso, há também que se olhar para a utilização de algumas inovações, especialmente nas operações logísticas como veículos autônomos, drones e VTOL, bem como automação em operações de comercio eletrônico.

De acordo com a sua experiência, como o setor evoluiu em relação a esse sentido de comunidade?

Diferentemente das profissões clássicas e que se reúnem em torno de “conselhos”, como Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura, Conselho Regional de Medicina etc., o que tentei fazer no final dos anos 80 foi organizar a comunidade em torno de uma Associação. Assim, em 6 de junho de 1989, presidi a assembleia de fundação da Associação Brasileira de Logística, a verdadeira ASLOG. No entanto, com o crescimento de certa forma desordenado do que pode se entender como “profissional de Logística”, esta própria entidade perdeu seus fundamentos originais e o que se observa. Portanto, o que temos hoje é uma série de comunidades virtuais nas redes sociais.

Acredito que parar não esteja nos seus planos. Então, o que podemos esperar do Vantine para os próximos anos?

De fato, parar não está nos meus planos. Ao contrário, em condições saudáveis física e mentalmente, a mola propulsora da minha motivação continua tal qual 50 anos atrás, com a diferença de que hoje eu tenho 50 anos de experiência. Portanto, devo continuar mantendo outro dos meus pensamentos originais: pioneirismo e vanguarda. Mas, tal qual um cirurgião que se realiza salvando vidas, a minha realização inspiracional é a satisfação dos clientes ao verem nossas soluções criativas para seus problemas. Isso me move!

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